terça-feira, 10 de janeiro de 2012


                                       “O ENCONTRO MARCADO” (*) 

                    Entrevistado: Rubens Barros de Azevedo 

                      1º) Onde você nasceu. Como foi sua infância e juventude? 

- Nasci no dia 18.09.1937, no centro do Rio de Janeiro, na Maternidade do Hospital dos Servidores da Prefeitura. 
Meu pai - Bernardino Moreira de Azevedo - era servente da Prefeitura e garçom nas horas vagas, e minha mãe, Léa Barros de Azevedo, dedicava-se à criação dos 08 filhos, sendo eu o mais velho. 
Passamos muitas dificuldades, mas com garra e muito trabalho de meu pai fomos superando tudo. Aos 07 anos eu já estava trabalhando para ajudar a sustentação da família. Fui dispensado do serviço militar, considerado “arrimo de família”, pois trabalhava durante o dia e estudava à noite. Quanto aos meus irmãos, 03 masculinos e 05 femininos, cedo começaram também a ajudar, não só nas tarefas domésticas, mas em pequenos trabalhos remunerados. 

                        2º) Como você fez opção pela profissão odontológica? 
- Meu padrinho, Cirurgião-Dentista Dr. Antônio Ferreira Brito, atendia na sua residência, no Engenho Novo, e fazia também os trabalhos protéticos. Eu aprendia e executava pequenos trabalhos e, gradativamente, assumi outros mais complexos e, claro, convivia com a clientela. Tomei gosto pela profissão e, um ano após casar (1963), prestei exame vestibular e ingressei na Faculdade de Odontologia da Universidade Federal Fluminense, em Niterói. 
Detalhe importante: Trabalhava em Bonsucesso, chefiando a seção de Contas-correntes do Banco do Estado da Guanabara, onde ingressei por concurso. Saía da agência às 16 horas, e precisava estar na faculdade às 17 horas! Impossível, pois naquela época não havia a ponte ligando o Rio a Niterói, eram somente as barcas da Cantareira e Frota Carioca. Conclusão: Perdia sempre as 02 primeiras aulas, ficando em 2ª época nos 04 anos de faculdade, mas nunca em dependência. 

                       3º) Fale de sua atuação na atividade clinica e no magistério. 

- Clínica: Tão logo concluí o curso comecei a atender em várias clínicas, no Rio (Av. Rio Branco, centro do Rio) e em Niterói (Centro da cidade), onde morava desde o casamento. Concluí o curso de especialização em Endodontia, na Policlínica Geral do Rio de Janeiro, durante o dia, continuando no Banco, mas em expediente noturno na Agência Castelo - centro do Rio. Fui eleito Presidente da ABO-Niterói, reeleito várias vezes. 

- Magistério: 05 anos depois de graduado, fui convidado pelo Prof. Miguel Bittencourt, Diretor da Faculdade de Odontologia de Nova Friburgo/RJ, para fazer parte da Clínica Odontológica, ministrando aulas teóricas e práticas de Anestesiologia, Cirurgia e Clínica Integrada. 
Fui convidado para exercer o cargo de Coordenador de Ensino e Pesquisas, compondo a Diretoria da Faculdade, durante várias gestões - mudava o Diretor e o Vice-Diretor, mas eu era confirmado naquele cargo de confiança. 

   4º) Quando, como e por que fez o trajeto até Portugal para exercer a profissão? 
- Por concurso, ingressei no antigo INAMPS, onde exercia o cargo de Supervisor de clínicas odontológicas conveniadas, em grande parte da região. Paralelamente, atendia num consultório que montei no centro de Nova Friburgo, exercendo a especialidade de Endodontia - era, praticamente, o único profissional dessa área na cidade. 
Desde essa época, era convidado para trabalhar em Portugal, mas seria impossível deixar as atividades docentes e o serviço público. Mais tarde, aposentei-me do INAMPS, então resolvi pedir demissão da Faculdade, me separei da mãe (Nilcéa) de meus 02 filhos - Patrícia, hoje com 42 anos, vivendo em Nova Friburgo, e Vinícius, com 40 anos, em Curitiba/PR. Assim, sem vínculos diretos, aceitei o convite para trabalhar com meu colega de turma, Dr. Messias Cláudio Correia, no Algarve (Albufeira e Portimão, simultaneamente). Depois me mudei para o norte, sempre atrás de melhor trabalho: Serra da Estrela (Guarda/Sabugal), depois Porto, Alentejo (Moura) e outras cidades até chegar a Lisboa, completando um ciclo de 08 anos. 

5º) Na sua atuação clinica, sofreu alguma discriminação em Portugal?                         - Diretamente não, mas vários colegas foram perseguidos pela PJ (Polícia Judiciária) e deportados para o Brasil, sumariamente! Engajei-me na luta para a nossa regularização naquele País irmão - eu tinha uma Portaria do Ministério da Saúde português, que me dava apoio legal para trabalhar sem correr o terrível risco da repressão. Passei a trabalhar junto a ABO-Portugal, para que fosse normalizada de vez a nossa situação. A quantidade de profissionais brasileiros era enorme e aumentava cada vez mais... Lá ainda não havia faculdades de Odontologia (na verdade, Medicina Dentária, nomenclatura lusitana), mas, sim, profissionais formados nas Faculdades de Medicina, com o título de Estomatologista, cujo currículo pleno previa uma carga horária bem menor para a abordagem odontológica propriamente dita. Éramos chamados de Odontologistas, isto é, nem Médicos Dentistas nem Estomatologistas, pois não nos enquadrávamos nestas 2 situações profissionais. Depois de um intenso trabalho da ABO,  sob a aguerrida e eficiente direção do colega HIRAM FISCHER TRINDADE, e movimentação junto à imprensa, sensibilizamos a opinião pública e nossos pacientes, que nos davam total apoio devido à excelência dos serviços prestados. Finalmente, chegou-se a um consenso junto às autoridades lusitanas. Foi estabelecido o critério de avaliação da carga horária de cada curso e o respectivo conteúdo programático das disciplinas cursadas no Brasil. É justo registrar que não havia (e penso que até hoje não há...) uniformidade quanto ao currículo pleno entre as diversas faculdades/universidades brasileiras, motivo maior da discórdia impeditiva. 

            6º) Trace um paralelo entre a Odontologia do Brasil e de Portugal. 
- Nos primórdios da Odontologia em Portugal, houve um desenvolvimento fundamental através do exaustivo e profícuo trabalho de vários mestres brasileiros. Com muito orgulho para nós, dois são potiguares: Os Professores SOLON GALVÃO FILHO e NELSON JOÃO SILVA, muitíssimo contribuíram para a expansão da nossa profissão além-mar. Hoje, Portugal desenvolveu-se conveniente e adequadamente, oferecendo um ensino de alta qualidade. Quanto ao Brasil, nossa classe já viveu dias melhores, mas estamos sobrevivendo, apesar dos famigerados planos de saúde. Penso que poderíamos, em termos acadêmicos, oferecer melhores subsídios para os jovens que deixam as universidades quanto à preparação para enfrentar as dificuldades de relacionamento com a clientela - principalmente em relação ao marketing e aos aspectos, digamos, comerciais da profissão. E digo isto desde os tempos em que era estudante... 

7º) Quando você resolveu voltar, por que escolheu Natal para morar e trabalhar?        - Não criei raízes profundas em terras lusitanas, até porque já estava com 60 anos de idade, e não investi na compra de uma clínica - embora tenha recebido tentadoras propostas. Observei também que, gradativamente, aumentava bastante a concorrência, enquanto o poder aquisitivo do povo já mostrava sinais de deterioração. Foi época de transição da moeda local - Escudo/Euro - com as consequências desastrosas que hoje constatamos. Numa das minhas vindas para passar férias, estava em Recife quando um amigo me convidou para vir a Natal num passeio de fim de semana com a família. Aceitei de imediato e, assim como todos que aqui vêm, encantei-me com esta terra maravilhosa! Ficaram gravadas na minha tela mental as belezas naturais deste local. Quando precisei decidir o meu novo destino ficou fácil! Disse a mim mesmo: Voltarei para o Brasil para viver no nordeste, tem de ser em Natal, preferencialmente, para escrever! Graças a Deus tudo aconteceu como previ. Mas uma ressalva: Pouco depois de chegar, trazendo uma lusitana na bagagem - Maria de Lourdes, que logo rebatizei de MALU, mais apropriado para ser usado aqui - fui convidado pelo colega e amigo HUMBERTO DANTAS para trabalhar na clínica dele. Embora com alguma relutância, em função da minha decisão de, apenas, escrever, aceitei e lá fiquei durante algum tempo. Aproveito para, de público, agradecer a bondade e a solidariedade demonstrada por esse brilhante profissional em relação à minha pessoa. 

8º) Você tem uma atuação muito forte em vários setores culturais. Quantos blogs você administra?  

- A minha atuação na área cultural vem de longa data, bem antes de morar em Portugal, onde também atuei em algumas atividades. Ainda em Nova Friburgo participei de vários segmentos, dentre outros: Escrevia no jornal local “A Voz da Serra” uma coluna - que depois passou a ser uma página inteira, relatando as atividades artísticas e culturais; dirigia um programa de entrevistas na TV (SBT) chamado “Uma questão de cultura e arte”, com artistas, literatos e afins, mostrando o trabalho que desenvolviam; Fui diretor da Cultura Artística de Nova Friburgo, que oferecia, com apoio da prefeitura e da comunidade, espetáculos diversos, sempre gratuitamente, apresentando artistas e orquestras nacionais e internacionais. Em Portugal também atuei nesse setor, tendo, inclusive um programa semanal na rádio de Moura (Alentejo), dando dicas de prevenção odontológica. Os blogues foram idealizados em vários segmentos em que atuo: CONFRAM, onde estou “secretário” (www.confram-natal.blogspot.com); Academia Norte-Rio-Grandense de Odontologia, onde estou Diretor-Adjunto de Propaganda e Divulgação (www.academianro.blogspot.com); Associação Brasileira de Fissuras Lábiopalatinas, onde estou Presidente da seção RN e Vice-Presidente em nível nacional (www.abfissuraspalatinas.blogspot.com); Sociedade Brasileira de Dentistas Escritores, onde estou Presidente em nível nacional, várias vezes reeleito (www.dentistasescritores.blogspot.com); Loja Maçônica Sete de Setembro, onde atuo como Chanceler (www.lojamaconicasetedesetembro-natal.blogspot.com); Sindicato, no Conselho Fiscal (www.soern-dentistas.blogspot.com). Faço parte do Corpo Editorial dos blogues lusitanos, criados e administrados pelo dileto amigo, Prof. Carlos Morais dos Santos. www.: culturaseafectoslusofonos.blogspot.com, pro-civitas.blogspot.com, lusotur.blogspot.com 

       9º) Você tem uma boa atuação literária. Quantos livros você já publicou?            - Foram lançados 12 livros, sendo 01 com 08 edições, 01 com 03 volumes, 01 com 02 volumes, alguns escritos por encomenda do Grupo Saúde e Vida (São Bernardo/SP), distribuídos em escolas de todo o País, sobre variados temas, incluindo, claro, a Odontologia, todos escritos sob a forma de perguntas e respostas, de maneira didática. 

10º) Qual sua impressão da cidade de Natal, que lhe acolheu com tanta generosidade? - Aqui encontrei o local ideal para viver: cidade pacata (com algumas características quase provincianas); beleza natural espetacular; praias de águas mornas e convidativas - onde mergulho diariamente, entre as 05 e 06 horas da manhã; povo altamente acolhedor; vida cultural, artística e científica de alto nível, enfim, tudo que precisamos para viver bem. Agradeço sempre a Deus por ter me proporcionado o privilegiado desfrute de todas essas benesses! Aproveito para agradecer também ao Presidente da CONFRAM, por me proporcionar a honra de inaugurar esta seção. 

(*) Entrevista concedida ao Presidente da CONFRAM, Dr. Givaldo Soares, que a elaborou.

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